Mais um destino conhecido, que volto a visitar graças ao #198Livros. Só que desta vez não contei com a boa vontade do autor, muito pelo contrário, se dependesse dele não retornaria jamais. Isso porque, um dos personagens do livro, que vem a ser o narrador, embora seja austríaco, não suporta a Áustria. Os personagens fazem parte do livro O Náufrago de Thomas Bernhard, que criou uma história híbrida em que personagens reais, Glenn Gould e Vladimir Horowitz, ambos grandes pianistas, se misturam com personagens fictícios, Wertheimer e o narrador, também pianistas.
O livro narra o retorno do narrador a Áustria, para o funeral de Wertheimer, e ao passado de 28 anos atrás, época em que os três jovens pianistas, Glenn Gould, Wertheimer e o narrador se conheceram. Eles foram estudar na Mozarteum, em Salzburgo, com o grande mestre Vladimir Horowitz, tornando-se a partir de então grandes amigos. Todos ambicionavam tornarem-se virtuosos no piano, mas somente Glenn Gould seguiria adiante como gênio do piano, os outros dois viram seus sonhos se desvanecerem ao escutarem Glenn Gould tocar as Variações de Goldberg, de Bach. A partir do momento que eles o escutam tocar, ficam convencidos que jamais poderão tocar daquela maneira e assim desistem do piano. A consequência dessa decisão em suas vidas é devastadora, Wertheimer, que é o próprio náufrago, termina se suicidando, e é justamente para o seu funeral que o narrador retorna de Madri, onde vive. Após a cerimônia decide ir até a casa do amigo, em busca de um manuscrito que ele supostamente teria escrito, passando pela pousada onde costumavam ir. Enquanto espera a dona da pousada começa a reviver sua vida e a dos dois amigos, que estão mortos, e a repensá-las. Ele faz uma verdadeira catarse de tudo que viveu, individualmente, e entre eles, e ainda, como a personalidade de cada um influenciou a dos outros. Na verdade, Glenn Gould foi quem deu o tom, pois influenciou muito mais do que foi influenciado, inclusive foi ele que identificou Wertheimer como sendo um náufrago na vida.
Apesar dos personagens serem muito depressivos em relação a vida, a leitura é muito intensa, a gente não consegue parar, vamos seguindo no ritmo do narrador e das palavras, ficando quase sem folego. O livro é escrito em apenas 4 parágrafos, os três primeiros bem curtinhos, como apresentação, antes de mergulhar nas lembranças a partir do quarto, que segue até o final do livro, sem pausa. Muito boa a viagem.