Brasil

Como as opções para escolher apenas um livro para representar o Brasil, no projeto dos 198livros, eram muitas, optei por utilizar meu critério pessoal, e aproveitei para ticar mais um livro da minha listinha de desejos. E o escolhido foi S. Bernardo, de Graciliano Ramos. Esse livro consta em todas as listas de livros que devem/merecem ser lidos. E de fato, depois que você começa a leitura, não deseja mais parar, até chegar a última palavra. Escrito de forma simples, despojada, assim como se fala, pois quem narra é o protagonista, Paulo Honório, homem muito simples, do sertão, que não é “versado nas letras”, mas que prende a atenção da primeira a última palavra, porque o narrador, como sugere Graciliano, “diz” com palavras a sua história. Segundo palavras do autor: “A palavra não foi feita para enfeitar, brilhar como ouro falso; a palavra foi feita para dizer“.

Logo no início do livro Paulo Honório revela o projeto de escrever um livro contando sua história, mas nem ele mesmo sabe, com que finalidade, já que nem é escritor e nem pretende mudar de profissão, mas percebe-se que está em busca de algo. Então ele inicia a narrativa, avaliando sua idade em torno de 50 anos, já que em sua certidão não consta nem pai nem mãe, apenas os padrinhos, e o assentamento no livro de batizados, ou seja, ele não tem família. Para ele, ser o iniciador de uma família, pode ser visto de duas formas, se por um lado é decepcionante, por outro o livra da maçada de suportar parentes pobres. Esse jeito de encarar a vida, já nos dá uma ideia da personalidade de Paulo Honório, que saiu do nada para tornar-se um bem sucedido agricultor, adquirindo a fazenda S. Januário, que era sua ambição, casou, constituiu família, cultivou amigos, construiu escola e capela, mas nada disso, o tornou feliz. E na verdade, no momento em que inicia a narrativa, muito do que conquistou, já lhe fugiu pelas mãos, sem que ele pudesse compreender, de fato, o que aconteceu, ainda que tenha consciência de que foi ele o único responsável. Os demônios, estão a sua volta, as viradas que a vida dá, marcadas pelos pios das corujas na torre da igreja, e pela escuridão das noites insones. Quem sabe, escrevendo, ele possa encontrar a paz.

Bélgica

 A primeira vez que ouvi falar de Amélie Nothomb, uma escritora belga, foi durante minhas aulas de francês na Aliança Francesa. Estudei trechos do livro Stupeur et Tremblements, na Aliança do Recife, e características de sua personalidade exótica, na de Paris, e foi lá, que, passando por um sebo, avistei Hygiène de l”Assassin. Na época, já participava do projeto 198livros, e logo decidi que esse seria o escolhido para representar a Bélgica. Amélie Nothomb, é filha de um diplomata belga, nasceu em 13 de agosto de 1967, em Kobe, no Japão, onde viveu até a idade de cinco anos. O Japão, junto com a Bélgica, foram os países que constituíram sua identidade cultural.

Hygiène de l’Assassin foi o primeiro romance de Amélie, publicado em 1992, vendeu milhares de cópias, e foi trazido para o Brasil em 1998. De lá para cá, Amélie já publicou mais de 20 livros e recebeu vários prêmios, entre eles: Grande Prêmio do Romance da Academia Francesa; Grand Prix Jean Giono; Prix de Flore 2007. No livro, a escritora nos conta a história de Prétextat Tach, um prêmio Nobel da Literatura, que aos oitenta e três anos, descobre que tem um tipo raro de câncer nas cartilagens e que não tem mais que dois meses de vida. Quando chega ao conhecimento do publico, a proximidade de sua morte, jornalistas do mundo inteiro solicitam entrevistas privadas com o escritor. Ele que é um monstro de obesidade e misantropia, resolve conceder cinco entrevistas, pré selecionadas por seu secretário, de acordo com sua orientação. Elimina todos os jornais de línguas estrangeiras, pois ele só fala francês e não confia em nenhum intérprete; não aceita jornalistas negros, pois com o tempo se tornou racista; afasta canais de televisão, revistas femininas, jornais políticos e principalmente revistas de medicinas. Foi no dia 10 de janeiro, que a notícia de sua morte iminente, chegou ao conhecimento do público, e no dia 14, tem início a primeira das entrevistas com os jornalistas selecionados. Prétextat reflete em sua aparência obesa e asquerosa, o seu interior amargo e desagradável. Com os quatro primeiros, ele recebe mal, demonstra todo o seu desprezo pelos jornalistas, duvida da capacidade de ler e entender os seus livros, tortura-os a ponto de fugirem assustados. Até que chega a quinta jornalista, uma mulher. Nina, é uma jornalista-detetive, leu todos os seus livros, investigou suas origens e vai virar o jogo. As perguntas simples vão evoluir para um interrogatório, encontrando no passado o crime escondido em sua literatura. O livro é feito basicamente de diálogos, porque segundo a autora nenhuma forma de escrita se aproxima tanto da tortura.. Um romance eletrizante, com um final surpreendente.

Israel

                      Recentemente terminei de assistir as duas temporadas da série Fauda, produzida pela televisão israelita. que aborda o conflito entre a Palestina e Israel, utilizando o gênero suspense político. A série é eletrizante(espero que produzam a terceira temporada), e está fazendo sucesso até entre os árabes. Fauda, é uma palavra árabe, para denominar “caos”. Quanto mais assistimos e lemos sobre o tema, mais ele nos parece indissolúvel. Claro que a série sendo uma produção israelita, é parcial, mas acredito que o fato de estar se tornando popular também na Palestina, é porque mostra, que no final estão todos no mesmo barco. E que são seres humanos acima de tudo, bons e maus, certos e errados! Acho que foi isso que Dorit Rabinyan pensava, quando escreveu o romance All the Rivers, baseado em sua própria história de amor com o artista palestino Hassan Hourani, a quem o livro é dedicado. Foi publicado em Israel em 2014, e no Reino Unido em 2017. A história de amor entre uma judia e um árabe, causou a maior polêmica em Israel, após o livro ter sido proibido pelo Ministro da Educação, no ensino médio, em 2015. Havia aqueles que a consideraram uma traidora, e os que a defendiam, alegando liberdade de expressão.

                                            Os personagens do livro são Liat e Hilmi, e o cenário é Nova York, pós atentados de 11 de setembro. Ela é de Tel Aviv,  uma judia de origem iraniana, tradutora, e está em Nova York, como parte do programa do seu mestrado em Literatura Inglesa. Ele é um artista palestino, de Hebron e Ramallah, e que já morava na cidade havia alguns anos. Apresentados por um amigo em comum, eles se sentem atraídos, apesar da rivalidade de seus países, e da impossibilidade de uma relacionamento entre eles. Hilmi diz a Liat três coisas logo no início; ele não sabe dirigir, nunca deu um tiro e não sabe nadar, e ela percebe depois da primeira noite, que deveria, para o bem de ambos, por um ponto final no relacionamento. No entanto, embora tenha essa consciência, o relacionamento evolui rapidamente. Pouco a pouco, vão se inteirando, de como as ações de cada país interferem na vida do outro, passando a ter uma nova visão do conflito. Mas apesar, dos pequenos contratempos, que suas diferentes realidades provocam, o amor que sentem um pelo outro, é a maior realidade que podem experimentar, ali longe, no inverno gelado de Nova York. E vivem numa bolha, aproveitando tudo que podem, pois Liat, tem data certa para voltar para Israel, onde é impossível se encontrarem! Uma linda história de amor!

Egito

Na dúvida, escolha um Premio Nobel, essa tem sido uma das máximas para minhas escolhas dos livros, nesse projeto, sempre que possível, claro. E foi assim que a escolha recaiu sobre Naguib Mahfuz, o primeiro autor de língua árabe a receber um Nobel, em 1988. Ele nasceu no Cairo, no bairro de Gamaliyya, em 1911, onde cresceu, e onde ambietou mais tarde, vários de seus romances. Formou-se em filosofia pela universidade do Cairo, em 1934, tendo publicado seu primeiro romance aos 17 anos. Possui uma vasta obra, simbolicamente dividida em quatro fases. Sendo a primeira, composta de romances históricos ambientados no Egito Antigo; a segunda, a partir de 1945 é considerada de cunho realista, e da qual fazem parte Trilogia do Cairo; na terceira fase aborda temas reflexivos e digressões filosóficas; e a partir de 1967, inicia um enfoque mais social e político. O livro escolhido, Miramar, pertence a essa última fase, e foi publicado em 1967.

O romance é ambientado na cidade de Alexandria, no início dos anos 60, na elegante e decadente pensão Miramar. O início do romance coincide com a chegada do primeiro, dos quatro hóspedes(Amer Wagdi, Hosni Allan, Mansur Bahi e Sarhan Al-Biheiri), e da jovem e bela camponesa Zohra, que chega a procura de emprego, e junto com a dona da pensão, Mariana, comporão os personagens da história. Por razões diversas os quatro hóspedes, procuraram a pensão Miramar, para nela residir. Em torno de Zohra, e do seu relacionamento com os hóspedes, se desenrolará toda a ação do livro, até que a uma certa altura, um deles aparecerá morto. Teria se suicidado? Quem teria interesse na sua morte? O livro, está dividido em 5 capítulos, narrados pelos hóspedes, sendo que Amer Wagdi, o mais velhos deles, é quem inicia e faz o fechamento. Através do relato de cada um, vamos conhecendo-os mais intimamente, e obtendo maiores esclarecimentos sobre os estranhos acontecimentos. Uma excelente história, que nos conecta a situação política e social do Egito naquela época, após sua independência. Narrado de forma fluída prende a atenção, até o desfecho. E tem uma capa linda!

Rússia

  Por incrível que pareça, até o ano passado, eu só tinha lido um clássico da literatura russa, Crime e Castigo, de Dostoiévski. No último trimestre resolvi seguir alguns projetos e entrei com tudo nos clássicos russos, o que me deixou no maior embalo em relação a essas leituras. A escolha de apenas um, para o projeto seria difícil, se Camila, não tivesse proposto uma leitura coletiva, de uma escritora contemporânea: The Mountain and The Wall, de Alisa Ganieva. 

A escolha desse romance trouxe algumas dificuldades e considerações, porque a história se passa no Daguestão, local de nascimento da autora, e do qual nada sabia; o que me levou de volta as minhas pesquisas, que me deram um enorme prazer. Assim, descobri que o Daguestão é uma república autônoma, que faz parte da Federação Russa, com uma população de 2.910.249 de habitantes, e diversas etnias. A língua russa é a principal língua oficial e o elo de ligação entre as diversas etnias. Essa, foi uma das dificuldades, da leitura, pois este foi o primeiro romance daguestanês, a ser traduzido para o inglês, e muitas expressões permaneceram em seus idiomas originais, e mesmo com o glossário, no final do livro, senti dificuldades para assimilar os termos. Pelo que entendi, os conflitos ali já existem há bastante tempo, pois de um lado está a Rússia cobiçando as terras do cáucaso, por sua posição estratégica; entre o mar negro e o mar cáspio, bem como o acesso a outros países; seus recursos naturais; fontes minerais e o agronegócio, além das reservas petrolíferas e de gás natural; e por outro lado a região do cáucaso, com uma etnia, cultura e religião islâmica, diferentes, e que não querem ser russos. No início, o conflito era apenas de ordem nacionalista, queriam a separação, e a religião muçulmana era apenas uma questão de escolha.  Porém com a ofensiva russa, que eliminou as principais lideranças separatistas, entraram em cena lideranças mais radicais, com a figura dos jihadistas, e que fazem parte da guerra santa global.

É basicamente este o cenário onde se desenvolve o romance de Alisa Ganieva, com a decisão da Rússia de construir um muro, para se proteger da tensão crescente, e do aumento da violência, nas províncias muçulmanas. Os rumores dessa decisão só tendem a aumentar a tensão crescente e a violência na região. Quem narra os acontecimentos é o protagonista, Shamil, um jovem repórter, que vê seu mundo desmoronar, tanto a nível pessoal, ao ser dispensando pela noiva, que o deixou para casar com um fundamentalista islâmico, quanto junto a família e os amigos, com a crescente tensão, provocada pelo avanço dos fundamentalistas, na comunidade local. Além, da situações vividas pelo protagonista, participamos junto com ele da leitura de diversos livros, de forma a contextualizar o leitor no universo deles. O sofrimento enfrentado por Shamil, vai transformá-lo, fazendo dele uma pessoa mais amadurecida. Não foi uma leitura cativante, primeiro pelo próprio enredo, e depois por se tratar de um tema bastante específico, que requer um esforço para assimilação, pelos termos difíceis de traduzir, e que impedem a leitura de fluir.

Barein

     Mais um destino desconhecido que visito através da literatura, e mais um que deixa um enorme desejo de visitar in loco, depois de me aventurar pelas imagens surpreendentes, e dicas de quem já o visitou. Só para se situar, o Barein, é um pequeno pais insular, situado no Golfo Pérsico, tendo por fronteiras marítimas, o Irã, o Catar e a Arábia Saudita. Embora seja uma ilha, existe uma ponte de 25 km, que liga o país a Arábia Saudita.  Apesar de ser um país muçulmano, é bem mais liberal do que os outros países árabes, e graças a liberdade que se encontra em Barein, tornou-se um destino muito atrativo para turistas, principalmente para aqueles, que vivem na Arábia Saudita, onde as restrições religiosas interferem na liberdade. Assim, para quem vive na Arábia Saudita, é só atravessar a ponte e já está em outro mundo.

Yummah, primeiro romance da escritora barenita Sarah A. Al Shafei, foi o livro escolhido para representar o país neste projeto. O livro conta a história de Khadeeja,  narrado por ela mesma, iniciando-se com seu casamento aos 12 anos, com um noivo escolhido por sua mãe, mas que era um estranho para ela. Para gente também é muito estranho, esse tipo de casamento, quase um crime, mas esse era o costume no Barain, naquela época. O romance continua com Khadeeja contando sua história, e a história da sua pequena ilha, como ela chama. Assim ela descreve o seu casamento, a ansiedade e o medo, que antecederam a noite de núpcias, e depois a descoberta do amor, e da vida em família, com os nove filhos. Também vai conhecer o sofrimento com a perda do filho querido; o abandono do marido, que saiu de casa, deixando-a só com oito filhos e grávida do nono; as dificuldades financeiras, e a luta para criar os filhos. Por outro lado, vamos acompanhando as mudanças e acontecimentos no país, como a independência do Reino Unido, a guerra do Iraque, etc. E através do relacionamento dos filhos vamos acompanhando a evolução nos costumes. Mas nada disso interfere no forte vinculo que ela soube criar, para manter a família unida. A palavra “yummah”, significa avó, a avó que Khadeeja se torna como matriarca da família.

Estônia

                         Somente após a primeira guerra mundial, foi que a Estônia pode se estabelecer como país, e mesmo assim, por um curto período(1918-1940). Até então, eram um povo buscando uma identidade como nação. Estiveram sob domínio dos finlandeses, suecos, dinamarqueses, alemães e russos. O domínio russo começou a partir do final do século XVIII, quando foi anexado ao Império Russo, depois de sucessivas guerras. Foi durante esse século que foram criadas as universidades no país, propiciando um maior crescimento e valorização da cultura estoniana, e da utilização do idioma estoniano. Precisei fazer uma pequena pesquisa da história da Estônia, para poder me situar no contexto histórico em que se passa o romance O Louco do Czar, de Jaan Kross, escolhido para representar o país no #198Livros.

                     Jaan Kross, nasceu em Tallin, em 1920, e formou-se em direito internacional, na Universidade de Tartu. Foi professor até 1946, desta mesma matéria, e professor de Artes Liberales em 1998. Por suspeita de “nacionalismo”, ou seja de militar pela soberania de sua pátria, passou 10 anos preso, tendo sido foi deportado para a Sibéria. Desses 10 anos, 06 passou no Gulag de Vorkuta. Ele é um dos escritores estonianos mais conhecido e traduzido, sendo sua principal característica, o relato da história e cultura do povo estoniano.

                         De todos os romances de Kross, O Louco do Czar é o mais conhecido e traduzido (14 idiomas). Conta a história do coronel Timoteus von Bock, um nobre, barão do báltico, ex-ajudante de ordens do czar Alexandre I, e um dos seus amigos mais chegados. No entanto, esta amizade não impediu que Timo fosse enviado para a masmorra por nove anos, e declarado louco, além de passar a ser alvo de rigorosa vigilância, depois que foi libertado, sem poder sequer se ausentar de sua propriedade. Qual teria sido o crime cometido por uma pessoa que gozava da mais alta estima e confiança do czar? Foi seu cunhado, Jakob Mettich, um camponês e servo emancipado, assim como Eeva, a irmã, com quem Timo se casou, quem relata suas descobertas num diário secreto. OJakob descobre que Timo havia enviado ao soberano, a quem tinha se comprometido de sempre dizer a verdade, um projeto de Constituição Liberal, como forma de deter o poder absoluto dos czares autocratas da Rússia. Os fatos relatados no livro são reais e foram extraídos desse diário, que se inicia a partir do retorno de Timo da prisão, em maio de 1827, e continua por uma dezena de anos. Durante a narrativa, ele nos leva a conhecer a fascinante personalidade de Timo, o grande amor que viveu com sua Eeva, a sociedade da época, e a busca da Estônia pela sua identidade como nação, sem dúvida um excelente romance. Vale a pena a leitura.

 

Haiti

               De acordo com o provérbio crioulo: O Lápis do bom Deus não tem borracha, não há como fugir ao destino irreparável, pois ele anda sempre a espreita. Foi esse proverbio que Louis-Philippe Dalembert, romancista haitiano, natural de Porto Príncipe, usou para título do romance, que retrata a infância vivida em Bel-Air, um bairro pobre situado as margens da baia de Porto-Principe. Louis-Philippe, deixou o Haiti, depois de ter se formado em jornalismo, e trabalhado nessa área em seu país natal até ir para França, para estudar Literatura Comparada, na Sorbonne, onde obteve o titulo de doutor. Poliglota(7 idiomas), já rodou o mundo, percorrendo sucessivamente, Haiti, França, Itália, Tunísia, Israel, Alemanha, África do Sul, Congo, Cuba e Brasil. Recebeu vários prêmios internacionais, entre eles o “Casa de las Américas”. Atualmente vive entre Itália, Paris e Porto Príncipe.

No livro, o protagonista retoma a cidade natal, depois de um prolongado exílio, na expectativa de reviver a infância tão presente em sua memória. No entanto nada encontra, nem os locais por onde viveu e passou, nem as pessoas que foram importantes em sua vida, principalmente Faustino, uma controvertida figura, mas que exerceu uma enorme influência para o menino. Depois da tentativa frustada de encontrar com Faustino, ele volta ao passado,  para o período em que viveu naquele bairro popular as margens da baia de Porto-Pinto, tendo um Peugeot 304 abandonado no quintal, como companheiro de brincadeiras, uma varanda como cenário, um galo, a avó severa, e suas tias-avós, e principalmente Faustino, de quem nada sabe, a não ser os cuidados que dispensava ao menino. E é com o amor que lhe devota, que imagina como seria a vida de Faustino, preenchendo com a imaginação as lacunas de sua vida, pelo menos as que lhe são desconhecidas. O autor divide o romance em duas partes, a vivida pelo menino, e aquela a que pertenceu Faustino, segundo sua imaginação, alternando os capítulos, e mesclando prosa e poesia.

Coreia do Sul

                     Kyung-Sook Shin, nasceu em 1963, numa pequena vila rural, perto da cidade de Jeongeup, na Coreia do Sul. Aos dezesseis anos mudou-se para Seul, para trabalhar numa fábrica de componentes eletrônicos, enquanto frequentava uma escola noturna. Foi durante um período de greve da empresa, que iniciou seu caminho na literatura. Aproveitava as paradas, para copiar num caderno de anotações, os trechos do romance que lia. Posteriormente, frequentou um curso de escrita criativa, no Instituto de Artes de Seul, publicando sua primeira novela, aos 22 anos.  Escreveu 7 romances, 7 coletâneas de contos e três obras de não-ficção, tendo recebido inúmeros prêmios na Coréia do Sul, onde é muito lida, e aclamada, além de ter recebido o prêmio Dong-in Literary e o francês Prix de l’Inaperçu. Divide o tempo entre Seul e Nova York, onde atualmente, é professora visitante.

                      Por Favor, Cuide da Mamãe, foi o livro escolhido para representar a Coreia do Sul, no projeto #198 livros, e o sexto romance escrito por Kyung. Publicado em 2008, na Coreia do Sul, foi a primeira obra sul coreana, a entrar na lista dos mais vendidos do The New York Times e a ficar entre os dez melhores livros de ficção escolhidos pela Amazon. Vendeu mais de 1,5 milhões de cópias, e foi publicado em 23 países. Segundo a autora, esse livro foi escrito para sua mãe. E o desejo de escreve-lo surgiu aos 16 anos, quando viajavam juntas, num trem para Seul. Ao olhar para mãe, viu como ela tinha um olhar solitário, então prometeu que um dia escreveria um livro e o dedicaria a ela.

                    O ponto de partida, é o desaparecimento de uma mãe, chamada Park So-nyo, de 69 anos, no meio da multidão, quando chegava com o marido, em Seul, para visitar os filhos. A história retrata a luta desesperada da família, para encontrá-la, e é narrada, de forma inusitada, por 4 narradores; a filha mais velha, o filho, o marido, e ela própria. Na verdade, há um só narrador, que dialoga com eles através de suas lembranças, trazendo-as de volta, para que através dessa realidade, vivenciada por eles, possam entender quem de fato era a mãe deles, e as dores pelas quais passou. Pois eles só a viam como mãe, e esposa, e não como uma pessoa com necessidades próprias, e é necessário fazer esse reconhecimento, para poder se aproximar mais dela. É um livro muito triste, pois o processo é doloroso, reconhecer, agora que a mãe não está ali, o que poderia ter sido feito para fazê-la mais feliz. Um livro que nos faz pensar, questionar, tentar encontrar uma maneira de estar mais próximo daqueles que amamos. Mas, o livro ainda vai além, através das lembranças dos personagens, vamos viajar pela Coreia, conhecendo suas tradições, como a Lua Cheia da Colheita; os rituais ancestrais do ano novo; a gastronomia, e traçar um retrato da atual Coreia.

Indonésia

           Embora o nome do país seja bastante conhecido, precisei olhar no mapa para me localizar, pois para mim, aquela região é muito confusa. O país fica localizado entre o Sudeste Asiático, e a Austrália, só que o “país’ é o maior arquipélago do mundo, com apenas 17 508 ilhas, então é realmente muito difícil, tentar visualizar. O romance escolhido, Guerreiros da Esperança, (Laskar Pelangi, no original e  The Rainbow Troops, em inglês), é o livro de estréia de Andrea Hirata, e se passa na Ilha de Belitung, local de nascimento do autor. Foi publicado em 2005, sendo o primeiro de uma quadrilogia, de inspiração biográfica, seguidos por: Sang Pemimpi(O sonhador), Edensor e Mayamach Karpov. Foi adaptado para o cinema em 2008.

          O livro, narrado por Ikal, um menino pobre, que assim como seus companheiros, têm o sonho e a esperança, que a educação possa mudar suas vidas. Eles vivem na pequena Ilha de Belitung, a mais rica da Indonésia, graças as suas reservas de estanho, descoberto pelos colonizadores holandeses, e explorado pela empresa PN Timah, que significa empresa estatal de estanho. A empresa foi tomada pelo governo indonésio, que assumiu não só os bens como a mentalidade feudal, pois mesmo após a independência, continuou com o tratamento discriminatório dado aos nativos. Esse tratamento, criou um contraste absurdo, entre os ricos executivos da PN exploradores de estanho e o povo nativo vivendo em extrema pobreza. Para garantir o direito a educação, conforme o artigo 33 da Constituição da República da Indonésia: “Todo cidadão tem direito a educação“, a jovem professora Bu Mus e do diretor Pak Harfan, são incansáveis na luta para possibilitar a Ikal e seus companheiros, esse direito. São muitas as dificuldades que vão enfrentar para garantir aos alunos a educação prevista na constituição. A começar pela ameaça de fechamento da pequena escola da aldeia, Muhammadiyah, pelo superintendente escolar do Departamento de Educação e Cultura da Sumatra, que exigiu o minimo de dez alunos para evitar o fechamento, depois vem a luta para manter a escola de pé, já que a estrutura física da escola é bastante precária. Há ainda o interesse de exploração do solo no terreno da escola. Somente a garra e a fé de professores e alunos para vencerem todos os desafios.   É comovente ver como os Bu Mus  e Pak Harfan, conseguiram criar laços fortes o suficiente, nos meninos, para enfrentar desafios, vivenciar o amor, dividir experiências e conquistar  vitórias.